O Brasil foi pioneiro na adoção em massa de veículos flex fuel, celebrando duas décadas desde o lançamento dos primeiros modelos. Essa tecnologia, que permite ao motorista abastecer o carro tanto com gasolina quanto com etanol, ou uma mistura de ambos, representou um avanço significativo em termos de flexibilidade e opções de consumo. No entanto, apesar de todo esse tempo e da popularização esmagadora dos carros flex – que hoje dominam a frota nacional –, uma grande parte dos motoristas ainda demonstra confusão, ou simplesmente opta por não aproveitar plenamente essa versatilidade, abastecendo majoritariamente com gasolina. A promessa de economia e adaptabilidade muitas vezes se perde na falta de informação ou na preguiça de calcular a melhor opção.
A cultura de “só usar gasolina” é uma realidade para muitos. Alguns o fazem por hábito, outros por acreditarem que a gasolina oferece melhor desempenho ou é mais “segura” para o motor, enquanto uma parcela significativa desconhece os critérios para uma escolha inteligente. Essa percepção é, em grande parte, um mito. Os motores flex modernos são projetados para operar eficientemente com ambos os combustíveis, adaptando-se automaticamente à composição do tanque. O verdadeiro dilema reside na equação econômica: quando é financeiramente vantajoso optar pelo etanol em vez da gasolina?
A regra de ouro, amplamente divulgada, mas nem sempre compreendida, é a do “70%”. Para determinar qual combustível é mais econômico, o motorista deve dividir o preço do litro do etanol pelo preço do litro da gasolina. Se o resultado for igual ou inferior a 0,7 (ou 70%), o etanol é a opção mais vantajosa. Se for superior a 0,7, a gasolina compensa mais. Essa regra se baseia no fato de que o etanol, apesar de geralmente ser mais barato por litro, oferece uma autonomia menor, cerca de 30% a menos que a gasolina, devido ao seu poder calorífico inferior. Assim, para ter o mesmo custo por quilômetro rodado, o etanol precisa ser proporcionalmente mais barato.
Entretanto, a decisão não é puramente econômica para todos. Há quem priorize o desempenho, e o etanol, por ter uma octanagem maior, pode oferecer uma leve melhora na potência e no torque em alguns motores, principalmente em altas rotações. Outros consideram o impacto ambiental; o etanol é um combustível renovável, derivado da cana-de-açúcar, e sua queima emite menos gases poluentes, contribuindo para a redução da pegada de carbono do veículo. Além disso, questões como a manutenção a longo prazo e o sistema de partida a frio (especialmente em regiões com temperaturas mais baixas) também podem influenciar a escolha, embora os avanços tecnológicos tenham minimizado muitos desses problemas iniciais dos carros flex.
Apesar de duas décadas no mercado, a plena compreensão e utilização estratégica dos carros flex ainda é um desafio para muitos motoristas brasileiros. É fundamental que a indústria automotiva, os postos de combustível e os órgãos de trânsito continuem a promover a educação sobre as vantagens e o uso correto desses veículos. Saber fazer o cálculo simples da relação entre os preços e considerar outros fatores como desempenho e impacto ambiental permite que o motorista não apenas economize dinheiro, mas mas também contribua para um consumo mais consciente e sustentável. Ignorar essa capacidade dos veículos flex é perder uma oportunidade valiosa de otimizar a experiência de dirigir e de contribuir para um futuro mais verde.