A proposta do Deputado Hugo Motta de elevar o teor de etanol anidro na gasolina comum dos atuais 27,5% para 35% reacende um debate complexo e multifacetado no Brasil. Embora a medida possa parecer um impulso à indústria sucroenergética e um passo em direção à sustentabilidade, suas implicações práticas para os motoristas e a frota veicular são significativas e, em grande parte, desfavoráveis, gerando preocupação generalizada.
O principal ponto de atenção reside no impacto sobre os veículos que não possuem tecnologia flex fuel. Carros mais antigos, veículos importados, motocicletas e até mesmo equipamentos com motores de pequeno porte (como geradores e cortadores de grama) não foram projetados para operar com uma concentração tão elevada de etanol. O etanol, por ser um solvente mais agressivo e higroscópico, pode causar corrosão e degradação em componentes como mangueiras de combustível, anéis de vedação, bombas e injetores. Materiais como a borracha e certos plásticos, comuns em sistemas de combustível mais antigos, são suscetíveis a ressecamento e rachaduras, levando a vazamentos, falhas no sistema e, em casos extremos, à parada completa do motor. A adaptação desses veículos seria dispendiosa e, em muitas situações, tecnicamente inviável, deixando milhões de proprietários em um dilema: arcar com reparos constantes ou substituir seus veículos prematuramente.
Além dos problemas técnicos para veículos não-flex, a proposta acarreta um aumento no custo por quilômetro para *todos* os consumidores, inclusive os proprietários de veículos flex. A razão é simples: o etanol possui um poder calorífico menor que a gasolina. Isso significa que, para gerar a mesma quantidade de energia e percorrer a mesma distância, um motor precisará queimar um volume maior da mistura com 35% de etanol do que da atual com 27,5%. Mesmo que o preço por litro da gasolina, devido ao maior teor de etanol mais barato, apresente uma ligeira queda, o consumo volumétrico maior anulará essa vantagem, resultando em um gasto total mais elevado para o motorista no final do mês. Essa realidade atinge diretamente o bolso do cidadão, impactando desde o orçamento familiar até os custos operacionais de frotas de transporte e pequenas empresas.
O argumento em favor do aumento do etanol frequentemente foca na redução da dependência de combustíveis fósseis e no potencial de diminuição de emissões de gases de efeito estufa. Contudo, esses benefícios ambientais são complexos e dependem de diversos fatores, como o método de produção do etanol e o ciclo de vida completo do combustível. Colocar um ônus financeiro e técnico tão grande sobre os consumidores, em nome de benefícios que ainda geram controvérsia, merece uma análise mais aprofundada e transparente.
É crucial que qualquer mudança na composição dos combustíveis seja precedida por estudos técnicos e econômicos abrangentes, que considerem não apenas os interesses da indústria, mas, sobretudo, o impacto direto na vida de milhões de brasileiros. A proteção ao consumidor, a viabilidade da frota existente e a capacidade de adaptação da população devem ser prioridades absolutas. A pressa em implementar uma medida com consequências tão amplas pode gerar uma crise desnecessária, tornando o custo da mobilidade ainda mais proibitivo para a maioria.